
A volta ao mundo de bicicleta
"A direção é muito mais importante do que a velocidade" - diz o arquiteto Argus Caruso, com um semblante de evidente timidez, logo no início de sua palestra. Alguém que começa a sua fala com uma frase dessas merece ser ouvido. Mas, eu não me detive na palestra por conta desse início instigador e, sim, porque eu já conhecia um pouco da história de Argus e queria saber mais daquele cara diferenciado.
Há poucos dias, ganhei do meu irmão Clovin o livro "Caminhos: volta ao mundo de bicicleta", publicado pelo SESC/SP. A obra é um colírio visual pelas dezenas de fotos tiradas pelo autor ao longo dos três anos em que percorreu o mundo em cima de uma bicicleta, saindo do Brasil, passando pela Bolívia e Peru, Oceania, Ásia, Europa e África. Também traz um rápido texto sobre a viagem, o qual te leva a pensar logo de cara: "Esse sujeito é - definitivamente - um maluco". Pense bem: ele resolveu dar a volta ao mundo e, poucos dias antes do início da viagem, não tinha nem a bicicleta, que dirá o preparo físico. Também não tinha patrocínio suficiente e não se preocupou detalhadamente com o mapa. Rodou por um ano com uma bike absolutamente simples. Com pouco dinheiro, comia e dormia em casas de desconhecidos de bom coração, os quais resolviam acolher aquele peregrino. Maluco, não?
Ainda bem que existe gente assim. Argus Caruso fez duas travessias oceânicas de veleiro até se decidir pela viagem. Mais do que a aventura em si, o que me deixou encantado foi o espírito que a moveu. "Eu resolvi ir de bicicleta porque eu queria ir devagar mesmo. (...) Eu queria conhecer todo o caminho" - disse Caruso na citada palestra, a qual está disponível em seu site na internet (www.arguscaruso.com.br). Quer maior contramão da humanidade do século XXI que essa? A gente não só não vive uma aventura assim como anda acelerado o tempo todo. Eu que o diga. Meu tempo é contado em minutos e gastar vinte minutos com algo que não está nos planos pode me trazer um transtorno gigantesco. Mas, fico aqui pensando, será que isso não me levará a simplesmente deixar de conhecer todo o caminho? Uma vida vivida a mil é o caminho certo para não notar o que vai se passando ao longo dela. A lição de Caruso vai além da bicicleta. Muito mais importante do que mostrar a cada um de nós que é possível viver um sonho, por mais ele seja um sonho maluco de largar tudo e andar de bicicleta por três anos, é a lição de que a direção é muito mais importante do que a velocidade.
Amei o livro que o meu irmão me deu, ele que também largou quase tudo para viver um sonho de bicicleta. Espero que a obra me marque além da simples leitura e me leve a desacelerar.
Alexandre Henry